Depois do ataque a Gaza : quem ganhou? - Selim Sezer

29-11-2012 23:15

 

O assassínio de Ahmad Jaabari, chefe militar do movimento Hamas, a 14 de novembro de 2012 foi o princípio do maior ataque sobre a faixa de Gaza desde o fim de 2008, início de 2009. Esta «operação pilar de defesa» durou 8 dias e deixou 162 mortos do lado palestiniano, mais de mil feridos e uma profunda destruição nas infraestruturas do território sob bloqueio. A razão invocada para o ataque foram os rockets disparados a partir de Gaza sobre Israel. Os porta-vozes das forças militares afirmaram que os únicos alvos eram combatentes, mas uma grande parte das vítimas são civis, incluindo mulheres e crianças.

Frequentemente afirma-se que o objectivo essencial de Netanyahu com esta operação era obter mais apoio para as eleições de 22 de janeiro de 2013. Seria certamente uma das razões. O discurso de base do partido Likoud é a «segurança» e os atuais dirigentes de Israel quiseram ganhar votos através da «eliminação do perigo». Sabemos ainda que 84 % dos israelitas (segundo o jornal Haaretz) apoiou este ataque, apesar das manifestações de alguns grupos pacifistas para o travar desde o primeiro dia.

Ainda assim, é apenas uma parte dos factos. Na realidade, o objectivo do governo de Tel Aviv era o de testar as posições dos atores internacionais.

É interessante que este ataque brutal tenha acontecido logo após as eleições presidenciais dos Estados Unidos. Netanyahu tinha declarado explicitamente o seu apoio ao candidato neo-conservador Mitt Romney, que é também seu amigo pessoal. A vitória de Obama, que tem uma visão diferente da de Netanyahu relativamente ao conflito israelo-palestiniano, foi evidentemente uma deceção para o primeiro-ministro sionista. Ainda assim, o presidente reeleito não hesitou em declarar o seu pleno apoio a Tel Aviv desde o momento em que Gaza começou a ser bombardeada. Não foi o único; a União Europeia e mesmo o Quarteto do Médio Oriente (de que a Rússia faz parte) apoiaram ou legitimaram o ataque.

Face a Israel, tão forte no plano internacional, a Resistência de Gaza ficou praticamente sozinha. A Síria deixou de ser um ponto de passagem do armamento por causa da desestabilização que se agrava de dia para dia, enquanto o Hezbollah evitou envolver-se diretamente, já que tenta acautelar o seu poder e as suas armas para uma eventual guerra civil no Líbano, que é um dos possíveis resultados do conflito sírio. Só o Irão continua a apoiar ativamente a Resistência, embora saibamos que apesar disso o movimento Hamas começou a quebrar a sua aliança tradicional com o Irão, a Síria e o Hezbollah.

Melhor dito, podemos atualmente falar de duas «fações» no seio do Hamas: uma é favorável à manutenção desta aliança e a outra defende uma nova aliança com o Egipto, a Turquia e mesmo com o Qatar («o eixo sunita»). É de assinalar que Ahmad Jaabari era o «número 1» do primeiro grupo e que tinha mesmo reagido contra o governo do Hamas em Gaza quando há algumas semanas acolheu o Emir do Qatar Al Thani.

Podemos dizer que Israel quis também testar os limites do Egipto e da Turquia. O presidente egípcio Mohammad Morsi é felicitado como o «herói do cessar-fogo», enquanto o ministro turco dos assuntos internacionais Ahmet Davutoglu chegou aos corações quando «chorou» em Gaza. É no entanto necessário salientar um ponto crucial: a única coisa que estes dois países fizeram foi agir como «árbitros» entre ocupantes e ocupados e preparar um cessar-fogo que não conseguiu nada senão a suspensão do conflito. A situação atual é a mesma que no início. Mas para Tel Aviv o resultado é claro: não há qualquer razão para temer o Cairo ou Ankara.

Apesar de tudo isto, Israel teve que terminar o ataque e aceitar o cessar-fogo ao fim do oitavo dia, e é evidente que previam uma operação muito mais longa. O único fator que conduziu a este resultado foi o poder imprevisto da Resistência e a perfeita coordenação entre os grupos diferentes. O próprio sistema «Cúpula de Ferro» não funcionou bem e os rockets Facr-5, feitos no Irão e transportados através do Sudão, caíram mesmo em Tel Aviv. É evidentemente um grande sucesso para Gaza e pode dizer-se que Israel evitará ataques semelhantes durante um tempo considerável. Mas não vão nunca desistir das suas intenções expansionistas e Gaza precisa de forças para resistir e manter-se.

Ao «chorar» em Gaza, Ahmet Davutoglu não contribuiu para a paz na Síria. Por seu lado, Ankara está activamente envolvida no conflito sírio, no qual é (para nós) impossível apoiar uma das partes e que se torna cada dia mais perigoso para toda a região. É a Síria que precisa de um cessar-fogo e Gaza que precisa de mais armas. Não o contrário.

Selim Sezer - Associação de solidariedade com o povo palestiniano (Turquia)

Tradução: Helena Romão

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