U.E 2012: Nenhum prémio da paz para o nosso tempo

16-12-2012 21:20


 

O Prémio Nobel da Paz é o prémio mais conceituado que assinala a defesa da paz. Com a nomeação da União Europeia em 2012, o prémio é atribuído a uma instituição que incentiva o rearmamento militar. A Iniciativa Prémio da Paz, composta por um grupo de 50 associações, organizou uma manifestação em Oslo contra esta nomeação, no dia 9 de Dezembro.

 

Pelo grupo de trabalho da Iniciativa Prémio da Paz 2012: Benedikte Pryneid Hansen (ATTAC Noruega), Marte Gustad Iversen (Juventude contra a UE), Heming Olaussen (Não à UE), Hedda B. Langemyr e Inger Aasgaard (Conselho Norueguês para a Paz) 

 

Desde o anúncio do Comité do Nobel Norueguês, em 12 de Outubro de 2012, as proponentes da nomeação para este ano têm realçado o reconhecimento do papel histórico da União Europeia na manutenção da paz, reconciliação e estabilidade na Europa. Deste ponto de vista, concordamos. Numa perspetiva histórica, a União Europeia é um projeto de paz. A Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, criada em 1950, evitou o rearmamento da Alemanha após a Segunda Guerra Mundial e a União Europeia tornou-se um organismo supranacional promotor da integração económica e política da Europa. Contudo, consideramos que o argumento da contribuição do papel da União Europeia para a construção de um mundo pacífico nos dias de hoje traz constrangimentos. É necessário questionar a imagem da União Europeia como merecedora de um Prémio Nobel da Paz, bem como as reivindicações de que o prémio deve cumprir as exigências de Alfred Nobel.

 

O seu testamento diz que o prémio deve honrar a promoção doo desarmamento e a redução dos exércitos existentes, o que vai ao arrepio da Política de Defesa e Segurança Comum da União Europeia. O Tratado de Lisboa, que todos os estados membros da UE ratificaram e que entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2009, incentiva cada estado membro a desenvolver o seu potencial militar. O argumento de que a UE está a desenvolver uma política de desarmamento é, portanto, falso. Pelo contrário, a UE continua a militarizar-se, o que está bem presente e manifestou-se através do apoio financeiro dos resgates que a UE ofereceu a países como a Espanha, Grécia, Espanha, Portugal e Itália, sob condição dos orçamentos militares e a importação de armas não serem reduzidos.

 

Em 2010, as despesas militares da Grécia totalizaram 7,1 mil milhões de euros, um acréscimo face aos 6,24 mil milhões de 2007. A razão para orçamentos militares tão elevados é um potencial conflito com a Turquia, apesar da Grécia não estar sob qualquer ameaça militar direta. Face à dívida astronómica da Grécia, julgar-se-ia prudente reduzir as despesas militares. No entanto, como podemos constatar, não é o caso. Enquanto se impõem cortes em todos os outros setores públicos, assegura-se a despesa menos sensata, mantendo a capacidade militar. As condições estipuladas nos vários pacotes de ajuda e a pressão levada a cabo sobre a Grécia para não fazer cortes nas aquisições para o sector da defesa, envolvem a manutenção da importação exagerada de armamento. Além disso, isto poderá implicar que o excesso de gastos militares pode continuar devido à crise da dívida.

 

A UE não tem um exército institucionalmente estabelecido, mas sim uma política colectiva de defesa e segurança e uma retórica que indicia mudanças. A UE tornou-se numa superpotência regional com ambições militares que se estendem para além da Europa. Na UE Existem forças que defendem a criação de um exército autónomo dirigido pela própria UE e independente da UN e da NATO. Ao longo da última década, a UE tem mostrado cada vez mais interesse em afirmar-se como um ator alternativo no quadro da política de segurança global. Ao olhar para a UE como uma superpotência económica, segue-se a ideia da construção de uma potência militar, sobretudo para a legitimação de intervenções em países vizinhos. Numa iniciativa conjunta dos ministros da defesa e negócios estrangeiros de cinco países (França, Alemanha, Itália, Polónia e Espanha), que teve lugar em Novembro de 2012, foram definidas operações militares e civis em países como o Mali, a Somália, a Líbia, a Geórgia e na região ocidental dos Balcãs. O Comité do Nobel Norueguês poderá correr o incómodo risco de ter um laureado enterrado em operações militares no futuro próximo.

 

No debate sobre a legitimidade da atribuição do Prémio Nobel da Paz à UE, diversos intervenientes defenderam que a exportação de armamento e armazenamento de armas nucleares em solo europeu não são da responsabilidade da UE. Contudo, tal argumentação não demonstra que a UE, como órgão supranacional, é na verdade coerente com os interesses dos seus estados membros. É certo que a UE não exporta armamento, mas isso de pouco vale quando nada é feito ao nível institucional para o reduzir ou prevenir. O que vemos é o aval institucional para a produção e exportação de armas através da diretiva da Transferência Intra-Comunitária. Isto significa a inclusão da indústria do armamento no mercado interno, o que estimula o sector e, além disso, contribui para que cada estado membro reveja a sua legislação relativa à manufatura e exportação de armas, já que o negócio é deslocalizado para países com leis mais permissivas.

 

Um número de organizações internacionais e antigos Prémios Nobel da Paz tomaram uma atitude crítica face à nomeação deste ano. Na Noruega, o debate polarizou-se entre a direita e a esquerda política, e reacendeu a longa e velha discussão sobre a adesão da Noruega à UE. O facto de os media noruegueses, os deputados e os membros do governo não conseguirem fazer avançar o debate sobre a cooperação norueguesa com a UE, é um indício de que a administração do Prémio Nobel da Paz deveria mudar. A proposta do Conselho Norueguês para a Paz para que o parlamento norueguês nomeie um novo comité, que inclua investigadores em assuntos da paz e ativistas de relevo, com mais experiência e um conhecimento profundo das temáticas da paz internacional, sai reforçada.

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