Desemprego: resolução do oximoro ou manobras de diversão? - Henrique de Sousa

22-02-2012 02:04

Durão Barroso acaba de proclamar, com o habitual jeito enfatuado e grandiloquente, o seu escândalo com o elevado desemprego juvenil em Portugal (35,4% dos desempregados), arrasando-o como "moralmente inaceitável". Alguns mais crédulos poderão julgar que isto significa uma súbita revolta contra as receitas austeritárias do patrão, o casal Merkozy. Engano. No mesmo passo, logo esclareceu que o programa de austeridade que patrocina e os seus capatazes portugueses levam mais além "não é ingerência", antes se fez "para bem dos portugueses".

Todavia não nos deixa sem remédio piedoso, nem esperança. Logo anunciou que decidiu "criar grupos de acção para se deslocarem de imediato a todos os estados europeus" com mais elevadas taxas de desemprego juvenil para estabelecer programas de acção que combatam tamanha praga.

O inevitável (e insuportável) ministro Relvas, para não ficar atrás, também anunciou, na mesma onda, que vai coordenar uma "comissão interministerial de criação de emprego e formação jovem" que o governo acaba de criar e que integra doze (sim, doze!) secretarias de estado.

Ah, tigres! Assim é que é falar. Já pensaram na quantidade de postos de trabalho que os "grupos de acção" e a dita "comissão interministerial" podem criar, de jovens e promissores apparatchiks, para estudar a solução da quadratura do círculo? Claro que vão longe as entradas de leão da redução dos aparelhos ministeriais, dos assessores e das comissões. Mas é por uma boa causa, a criação de empregos...

Ou seja, temos gente corajosa disposta a deitar mãos à obra para descobrir como é que um programa de empobrecimento, liberalização dos despedimentos, desvalorização salarial, aumento de impostos, salvação dos bancos, de protecção das parcerias público-privadas, da EDP, dos Catrogas e do Jardim, se pode tornar na nova oportunidade de crescimento económico e de criação de postos de trabalho que as estatísticas teimam em negar. São os novos pioneiros portugueses à descoberta de novos mundos para dar ao mundo.

Até pode acontecer, já agora, que não se esqueçam de criar outras comissões geradoras de emprego para o desemprego feminino, ou para os desempregados à procura de emprego há mais de dois anos (32,3%), ou até para a descoberta das insondáveis razões pelas quais, apesar dos esforços abnegados de Passos, Relvas, Catrogas & Cª, o desemprego em Portugal atingiu já o recorde absoluto de superar o milhão de pessoas.

De facto, estes valorosos governantes têm razões para confiar na avaliação que os seus patrões da troika cá vêm fazer. Têm obra para apresentar. E podem sempre contar com o PS, que é "oposição responsável" e não "oposição de protesto", como fez questão de sublinhar António José Seguro, ao anunciar que ia propor à troika (pasme-se!) medidas para combater o desemprego. Logo desenterrando da cartola, não a contestação do programa de austeridade (livra!), mas a proposta de extensão por mais um ano (releve-se a ousadia!) da aplicação do programa de sofrimento da troika para o distribuir melhor no tempo. Eis o consenso neoliberal no seu melhor, de que o PS não descola e continua prisioneiro.

Como se vê, até parece que o oximoro da receita ultraliberal está em vias de solução. Pelo menos no mundo virtual e alcatifado em que vivem. Se não, há sempre a emigração, não é?

A revolta dos comuns, essa, prossegue e há-de crescer até confrontar estes votos pios e estas manobras de diversão com o seu vazio. O resultado é naturalmente incerto.

Henrique de Sousa, membro da ATTAC Portugal

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