VPV: da arrogância e do azedume como modo de vida - Henrique Sousa

14-10-2012 19:53

O Congresso Democrático das Alternativas, segundo Vasco Pulido Valente: "a gente do costume", "extrema-esquerda",  "impotente e vociferante", "sessões de psicoterapia colectiva", "absolutamente inofensiva" (ver a sua crónica no Público de 7 Outubro). Foi isto que esta luminária “descobriu” e concluiu, logo lançando o anátema sobre uma assembleia cidadã plural como não se fez outra em 38 anos de democracia, a partir da solidão fechada e protegida do seu gabinete, em que vai ruminando contra o mundo hostil que o sustenta. Uma assembleia em que quase 2 000 pessoas preferiram durante um dia inteiro juntar-se, confrontar opiniões e esforçar-se, como sabiam e podiam, por desbravar caminho para a urgência de encontrar alternativas para a governação do país.

Há ainda quem lhe ache piada. Sobretudo quanto ataca os ódios de estimação de quem o lê. O homem é azedo, é verdade, mas é culto, de ascendência ilustre, escreve bem, doutorou-se em Oxford e faz gala da sua superioridade very british, percebe de história. O que sai dos neurónios de uma luminária assim merece respeito.

Só que o sujeito não é exemplo. Nem o seu pífio desempenho como secretário de estado da AD com Sá Carneiro, ou os meses fugazes em que passou como deputado do PSD pelo parlamento, saindo logo pela porta baixa, o qualificam especialmente para o debate político e das políticas ou caucionam as certezas arrogantes e ácidas que dispara sobre tudo e sobre todos. Sobretudo sobre os que não desistem da democracia e do seu país. Coisa de que ele já desistiu. E provam que um recomendável investigador e académico pode ser um caso desastroso no exercício da política, e, como é o caso, nos conselhos e comentários sobre a política.

Tornou-se um caso patético. Um bobo da corte zangado com o mundo, com a vida, com os outros, consigo próprio e que faz dessa zanga permanente e do anátema constante profissão e (também) sustento e prova de vida. Praticando o número de um pessimismo militante e arrogante, julga acertar (quase) sempre na previsão das desgraças. Faz jeito ao poder, porque a sua conclusão é sempre, em nome do realismo, a preservação da ordem, ou desordem, estabelecida.

Há muito que deixou de simpatizar com a democracia. Assembleias metem medo à sua solidão elitista de gabinete, confortável, bem paga e presunçosa. Aparentando disparar em todas as direcções, nunca falha todavia na defesa saudosa de uma ordem económica e política que lhe foge entre os dedos. Na verdade, um despotismo esclarecido com umas vagas tintas liberais é que era bom. Se fora o seu. Porque isto da democracia, das assembleias, da irrupção das massas na política, da igualdade e dos direitos, é um território cheio de perigos, em que os comuns ameaçam a sua confortável solidão e introduzem a incerteza.

É verdade. Escreve bem. Mas isso não chega. É uma pena. Mudemos de assunto.

Henrique Sousa, membro da ATTAC Portugal

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