Pensamento mágico nas Finanças - Luís Bernardo

02-10-2012 15:49

O pensamento mágico parece ter-se tornado moda. Já não é apenas uma moda cognitiva que sustenta uma indústria inteira de manuais de auto-ajuda.

Agora, o pensamento mágico chegou ao Ministério das Finanças, e Vítor Gaspar, na última comunicação efectuada ao país, voltou a demonstrar a extensão do problema. Apesar da linguagem e pose tecnocráticas, o ministro das Finanças - tal como, aliás, o primeiro-ministro - mostrou que o projecto político deste Governo e da ‘intelligentsia' que o rodeia é relativamente simples: desejar com muita força que algo ocorra e, se as coisas não correren como desejado... bom, desejar com força ainda maior e esperar que o céu, i.e. conjunto de variáveis macro-económicas que norteia a pseudo-política fiscal deste governo troikista, não nos caia na cabeça.

A reconfiguração dos escalões do IRS é um exemplo desta mundividência irreal. De acordo com um estudo independente realizado pela auditora PwC, ocorrerá um aumento da regressividade de um sistema fiscal cuja função redistributiva já está, actualmente, invertida. Porque distribui rendimento de forma ascendente em vez de corrigir assimetrias impróprias de um país civilizado. Como afirmou, em 1904, Oliver Wendell Holmes, juíz do Supremo Tribunal dos E.U.A, os impostos servem para comprar civilização. Mas também servem para a erodirmos, caso seja essa a vontade política predominante. Talvez, no mundo mágico do Ministério das Finanças, esse país não seja o país desigual dos estudos da OCDE.

No mundo real, aquele em que medidas draconianas são impostas a mando de um clube de credores e sujeitam um povo inteiro à destruição do seu modo de vida, com o beneplácito de elites políticas cartelizadas e hipnotizadas pela alquimia monetarista, esse país está em queda livre e urge reinventar a política, desmontando o pensamento mágico de auto-proclamados feiticeiros como Vítor Gaspar ou os representantes da ‘troika'.

Luís Bernardo, membro da ATTAC Portugal (texto publicado no Diário Económico e reproduzido aqui com autorização do autor)

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