Governo: a nódoa que exige mais rua e não só benzina - Henrique Sousa

02-10-2012 15:30

Vergonha!

O país acaba de saber que este Governo de lacaios dos mercados financeiros e dos credores enviou à socapa para aprovação da Comissão Europeia, e negociou com a troika, o pacote de medidas de austeridade alternativas à operação de roubo da TSU em que foi derrotado. Foi preciso ser a Comissão Europeia a comunicar triunfalmente aos pobres portugueses desta Europa do Sul supostamente pedinte e preguiçosa a sua aprovação de medidas propostas e acordadas pelo Governo que desgraçam mais o nosso futuro colectivo. Pela voz de um português que nos devia envergonhar a todos, fugitivo quando a casa estava a arder e agora confortavelmente instalado e alimentado pelos poderosos em Bruxelas.

Foi assim, com esta escandalosa cobardia e ausência de sentido patriótico e democrático, que estes capatazes dos credores se comportaram. Sem dar literalmente cavaco aos parceiros sociais, aos partidos, à Assembleia da República, aos portugueses. No maior silêncio público para que não fosse ainda maior a amplitude da indignação pública na grande manifestação do passado sábado. Mostrando todo o desprezo relativamente às instituições da democracia política  e do diálogo social, que só toleram enquanto retórica conveniente. Pregando mais um prego no caixão de uma concertação social instrumentalizada e governamentalizada. Comprovando que são apenas um grupo de capatazes sem vergonha, para quem a soberania política não conta e dispostos a tudo para defender os credores, mesmo contra a maioria dos portugueses e o país. Comparado com este Governo, até a figura histórica do Miguel de Vasconcelos é apenas um aprendiz de feiticeiro.

Os dislates do Borges e as asneiras do Relvas não são afinal erros e desvios do guião governativo. São o guião verdadeiro deste Governo e de um Primeiro-Ministro incompetente, convencido de que o seu grupo de engenheiros sociais ultra-liberais consegue pôr o país e a democracia de joelhos às ordens dos credores.

Talvez se enganem. Acabam na verdade de pregar  mais um prego no caixão do seu governo moribundo. Que é uma nódoa. O nosso maior problema colectivo. Causado, é certo, pelo voto e pela escolha de uma parte dos cidadãos. Errar é humano, se nos quisermos consolar com um voto pio sobre o passado. Mas retirar esta nódoa não pode ser apenas com benzina. Vai exigir o redobrar da manifestação popular pelo saneamento democrático deste país. Só possível correndo estes capatazes e devolvendo o voto e as escolhas políticas ao povo. Sem cair na esparrela dos governos tecnocráticos ou de salvação nacional que a direita dos interesses gostaria que fossem o seu plano B.

Já nada salvará do julgamento público a cínica e dúplice estratégia de sobrevivência de Portas, obrigado com o seu CDS a dar a cara por esta vergonha ou por uma vez assumir a vergonha disto e sair. Nem a UGT pode continuar a fugir à necessidade de modificar a sua estratégia e enfrentar o descalabro em que se converteu a concertação social em que tudo apostou. Nem o PS pode continuar a exprimir estranheza e surpresa, enquanto mete na gaveta a moção de censura que anunciara em nome de um sentido de responsabilidade que se confunde perigosamente com sustentação política deste governo com morte anunciada. Nem o Presidente desta maioria que já não é maioria pode continuar a fazer de salomão julgando que escapa por entre os pingos da chuva.

O tempo é de escolhas claras e de mobilização social e política por alternativas programáticas e de governação. E de vir à rua, mais e mais, as vezes que for preciso. Até lavar esta nódoa e esta vergonha da nossa democracia.

Henrique Sousa, membro da ATTAC Portugal

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